Ilha da Trindade

 

A Ilha da Trindade é uma das ilhas oceânicas do Brasil, de beleza singular. É parte do Estado do Espírito Santo, mas é administrada pela Marinha do Brasil. Localiza-se a 1.167 km de Vitória, no Oceano Atlântico, na Cadeia Vitória-Trindade, formada por antigos vulcões submarinos extintos. Possui incríveis formações rochosas, mas pouca vegetação. Desde os anos 1990, a Ilha tem passado por um processo de reflorestamento. Possui 12 picos, 2 morros, 10 pontas, 5 praias e um túnel. O ponto culminante é o Pico do Desejado, com 620 m, e a área da Ilha é de 9,2 km².

A partir de 1970, com a expansão do mar territorial brasileiro, de 12 milhas para 200 milhas (370 km), aumentou-se a percepção estratégica sobre as ilhas da Trindade e de Martin Vaz. Em 1988, a Convenção da ONU sobre o Direito do Mar, foi ratificada pelo Brasil, criando uma zona econômica exclusiva, dentro das 200 milhas.

A história dessas ilhas foi marcada por equívocos até boa parte do século 20. Não se sabe realmente quando foram descobertas ou assim nomeadas, mas já eram conhecidas na primeira década do século 16. Foram referência importante em diários de bordo de muitos navegadores. Mas a violência do mar sobre o litoral e o solo imprestável para a agricultura não permitiram que as tentativas de colonização tivessem sucesso.

Até o século 18, nessa região do Oceano Atlântico, a mesma ilha foi registrada, mais de uma vez, com diferentes nomes, em alguns mapas. Elas foram descobertas e redescobertas. Exemplo dos nomes: Trindade, Ascensão, Martin Vaz, dos Picos e Santa Maria de Agosto, além de variações de grafia.

O nome Trindade poderia vir da data em que alguém redescobriu a Ilha, chamada antes de Ascensão, ou de uma configuração de seus picos ou, ainda, poderia ser uma referência às três ilhas de Martin Vaz.

A Ilha da Trindade teria sido descoberta pela expedição do navegador português Estevão da Gama, em 1502, segundo Franz Hümmerich, mas Duarte Leite (História da Colonização Portuguesa do Brasil, vol. II, 1923), questiona alguns dos argumentos daquele autor. Segundo Leite, também não teria sido João da Nova, pois a Ilha não aparece no Cantino, mapa que registrou suas descobertas até aquele ano. A Ilha descoberta por João da Nova seria a de Ascensão, que hoje é britânica. João da Nova não erraria tanto na latitude. Curioso, entretanto, é que a Ascensão do Cantino é parte de um arquipélago, como pode ser considerada a Ilha da Trindade. A atual Ascensão britânica é, na verdade, uma ilha bastante isolada no oceano. A Ascensão do Cantino está em uma parte claramente retificada do mapa, que adicionou dados de João da Nova. Outra curiosidade é que a descoberta de Santa Helena também é atribuída à mesma viagem de João da Nova, mas não está no Cantino.

Até o século 18, houve muita confusão entre cartógrafos e cronistas, envolvendo a Ilha da Trindade, Ascensão e o Arquipélago de Martin Vaz. Mas as curiosidades sobre a Ilha da Trindade continuaram até o século 20.

O livro História Naval Brasileira (Marinha do Brasil, 1975) indica que ilha de Santa Trinidade está registrada no planisfério de Maggiolo de cerca de 1504.

Em 1539, D. João III doou a Ilha da Trindade, como capitania, para o fidalgo Belchior Camacho, que nunca tomou posse.

Em 3 de novembro de 1615, os navegadores holandeses Jacob Le Maire e J.G. Schouten passaram pela área e avistaram uma ilha. Schouten registrou que aquela seria uma das ilhas de Martin Vaz, chamada, segundo ele, de Ascensão (Miroir Oost & West-Indical, 1621). O historiador francês P. F. Xavier de Charlevoix, ao abordar essa referência de Schouten, observou que não poderia saber nem em que termos, nem por quem elas foram descobertas (Histoire et description générale de la Nouvelle France..., 1744). A ilha avistada, entretanto, não poderia ser do Arquipélago de Martin Vaz, como hoje referido, pois quem vê uma, vê logo as três. Foi provavelmente a Ilha da Trindade.

Em 1661, os holandeses demonstraram interesse nas Ilhas de Martin Vaz como apoio aos navios que iam à Cidade do Cabo, mas não conseguiram muita informação sobre as ilhas (Cartas do Cabo 1652-1662).

Em abril de 1700, o astrônomo inglês Edmond Halley visitou a Ilha em uma expedição científica e declarou ter tomado posse dela em nome do Rei da Inglaterra. Halley lá deixou casais de cabras, porcos e galinhas da Guiné, trazidas da Ilha de Santa Helena, para procriação, buscando atender futuros visitantes da Ilha da Trindade. Segundo E.F. Knight (The Cruise of the Alerte, 1890), em 1803, uma expedição estadunidense, comandada por Amasa Delano, constatou que existiam várias cabras e porcos na Ilha, mas, em 1822, Commodore Owen não achou tais animais. Sabe-se, entretanto, que outros animais, como gatos, ratos e ovelhas também foram deixados na Ilha, até o final do século 19. Acredita-se que esses animais, junto com a exploração de madeira por colonos, teriam reduzido bastante a flora local.

Em 1712, franceses estiveram na região e tomaram a Ilha de Martin Vaz (a maior do Arquipélago de mesmo nome) como sendo a Ilha de Ascensão. O engenheiro da expedição reportou, que, por ser parte de um grupo de três ilhas, eram tidas como a Trindade, por alguns navios. Ele observou que a "grande ilha de Ascensão" era um rochedo de cerca de uma légua e 1/2 de comprimento (Navegação nos séculos XVII e XVIII, por L. M. Hutter, 2005).

Em dezembro 1722, comerciantes ingleses de escravos chegaram ao Brasil, buscando contatos para estabelecer um posto na Ilha da Trindade. Em 1724, Portugal lançou planos para a ocupação e fortificação da Ilha da Trindade, mas tais planos não foram executados.

Em janeiro de 1757, o Brasil enviou uma missão para demarcar as ilhas de Ascensão, Trindade e Martin Vaz. Em 26 de maio daquele ano, documentos e mapas das ilhas foram enviados a Lisboa. O encarregado do levantamento, José Alves, informou, em relatório (original na Biblioteca Nacional), ter passado no local onde deveria estar a Ilha de Ascensão, mas não a encontrou. Informou ter achado a ilha que uns diziam ser Trindade, outros diziam ser Ascensão. Também fez referência às ilhas de Martin Vaz e Santa Maria de Agosto (outro nome da Trindade), em texto difícil de ler.

Em 1781, a Grã-Bretanha ocupou a Ilha e ergueu duas fortalezas: a da Praia e a do Alto, nas extremidades opostas da Ilha, conforme indicado em um mapa português, de 1782 (mapoteca do Itamaraty), feito em missão de reconhecimento. A guarnição britânica tinha mais de 40 homens, além de mulheres. Portugal protestou e, em 1783, enviou, do Brasil, a nau N.S. dos Prazeres, com 64 canhões, comandada pelo Capitão José de Mello Brayner, mas os britânicos já haviam abandonado a Ilha, deixando 12 canhões. O Mappa Chorographico da Ilha da Trindade, de 1783, no Arquivo Nacional, indica o Forte da Rainha (construído pelos britânicos), em posição ao Porto do Príncipe. Os portugueses passaram a ocupar a Ilha e chegaram seis casais de colonos açorianos, mas o solo não se prestou à agricultura. Os colonos constataram que as camadas de terra, em várias partes da Ilha, eram muito finas. A terra também mostrou-se facilmente inflamável. O Capitão Manoel Rodrigues Silvano foi enviado para comandar a Ilha com um destacamento de 150 praças, depois reduzido para 88 indivíduos. A Ilha passou, também, a servir como presídio.

Em 1784, o Vice-Rei do Brasil mandou um oficial da Armada verificar se existia mesmo uma outra ilha, que seria a de Ascensão, localizada a oeste da Ilha da Trindade, mas não acharam ilha alguma.

Em outubro de 1785, o Conde de La Pérouse, ainda no início de sua expedição francesa de circum-navegação, com dois navios: a Bussola e o Astrolabio, passou pelas ilhas de Martin Vaz e chegou à Ilha da Trindade. Avistaram uma bandeira portuguesa, içada em um forte, e cinco a seis casas de madeira, ao redor. Existiam algumas árvores nas montanhas e as ondas quebravam com força em todo o litoral. Embora preocupados com a violência do mar, resolveram mandar um barco à terra, que chegou ajudado pelos portugueses. Constataram que existiam cerca de 200 homens no porto, apenas 15 fardados. Os franceses foram recebidos com cordialidade, mas o comandante da Ilha não deu muita liberdade para os pesquisadores, que, ainda assim, fizeram algum estudo geológico e da defesa da Ilha da Trindade. Nessa expedição veio o artista francês Duché de Vancy, que desenhou uma vista da Ilha da Trindade. La Pérouse procurou pela Ilha de Ascensão, sem achá-la, e concluiu que seria a mesma Ilha da Trindade, após conversar os brasileiros.

Em 1793, o Conde de Resende determinou a desocupação da Ilha, que ocorreu em 1795. Os colonos açorianos foram para a Capitania de Santa Catarina.

Em maio de 1817, o Conde de Amerval deixou a França para viajar pelo mundo, a bordo do bergantim La Jeune Sophie, batizado em homenagem à sua filha. Em agosto, um incêndio no bergantim obrigou uma parada na Ilha da Trindade. A violência das ondas destruiu o bergantim e os passageiros seguiram, em uma lancha, para a praia. Eram 27 pessoas ao todo. Após 6 dias, o Capitão, o Conde e parte da tripulação partiram na lancha para o Rio de Janeiro, onde chegaram 13 dias depois. Uma embarcação de resgate foi enviada à Ilha da Trindade, onde encontraram apenas uma garrafa com um bilhete, declarando que tinham ido para a Índia em um navio que passara.

Em julho de 1826, o francês Dumont D'Urville, em uma expedição de pesquisa, passou por Martin Vaz e depois pela Ilha da Trindade. D'Urville notou as fascinantes formações rochosas da Trindade, observando que esta ilha inteira parecia muito estéril, mas existiam algumas árvores. Ele considerou desembarcar com pesquisadores, mas desistiu devido a violenta ressaca e fúria do mar em volta.

Em 1839, a Ilha foi visitada pelos pesquisadores ingleses Dalton Hooker e Sir Clark Ross. Outros pesquisadores ingleses visitaram a Ilha, em 1874 e 1876.

No século 19, corria uma lenda de um tesouro escondido na Ilha, que foi visitada por algumas expedições à sua procura. Esse suposto tesouro foi procurado até boa parte do século 20. Em 1889, o explorador inglês Edward Frederick Knight fez uma viagem à Ilha da Trindade, a bordo do Alerte, em busca do tesouro. Não achou, mas publicou o livro The Cruise of the "Alerte" (1890) com preciosas informações e mitos sobre a Ilha.

Em dezembro de 1894, a Grã-Bretanha ocupou novamente a Ilha da Trindade, visando estabelecer uma estação de cabo submarino, mas abandonou, no ano seguinte, após protestos do Brasil e uma amigável mediação de Portugal. Em janeiro de 1897, o Brasil enviou para lá o cruzador Benjamin Constant e ergueu um marco de soberania na encosta do Morro do Pão de Açúcar, em 24 de janeiro de 1897.

Em 1910, foi erguido o Monumento do Andrada, em granito, na praia que recebeu o mesmo nome.

Em 31 de agosto de 1914, durante a Primeira Guerra Mundial, o navio de passageiros alemão Cap Trafalgar foi transformado em navio de guerra com a transferência dos armamentos da canhoneira alemã Eber e parte de sua tripulação, ação que ocorreu na costa da Ilha da Trindade, que servia como ponto de apoio da Alemanha. Em 10 de setembro, a canhoneira Eber partiu desarmada para Salvador, Bahia. No dia 14 ocorreu a Batalha da Trindade. O Cap Trafalgar estava sendo abastecido, junto à Ilha, pelo navio-carvoeiro alemão Eleonore Woermann, quando foi atacado pelo navio britânico HMS Carmania, que afundou o Cap Trafalgar. No mesmo ano, o Brasil iniciou levantamentos na Ilha para a sua ocupação, que ocorreu em maio de 1916, servindo como apoio militar e estação radiotelegráfica, com cerca de 50 marinheiros e fuzileiros navais. Nesse período, realizou-se também pesquisas científicas na Ilha. Em dezembro de 1919, a Ilha foi novamente abandonada.

De 1924 a 1927, a Ilha foi transformada em presídio. Uma imagem de N.S. de Lourdes foi colocada na gruta que leva seu nome.

Em 1941, durante a Segunda Guerra Mundial, Trindade voltou a servir como apoio militar do Brasil, com uma base aeronaval. A Ilha foi novamente abandonada, em junho de 1945.

Em 1950, foi enviada uma expedição científica para planejar a ocupação da Ilha.

Em 11 setembro de 1953, a Ilha da Trindade e o Arquipélago de Martin Vaz foram incorporados ao Município de Vitória, pela Lei Estadual nº 732. Sabe-se que, desde a época do domínio português, a Ilha da Trindade estava associada à Capitania do Espírito Santo. Entretanto, a administração, de fato, da Ilha, tem sido feita pela Marinha do Brasil, como área de segurança nacional.

Em 1957, a Marinha instalou o Posto Oceanográfico da Ilha da Trindade, cuja área de atuação abrange também o Arquipélago de Martin Vaz, situado 47 km a leste. Aquele foi o Ano Internacional da Geofísica e a Ilha da Trindade foi um palco de investigações científicas, na área. No mesmo ano, tramitou no Congresso Nacional, um projeto de lei para instituir um Plano de Valorização da Ilha de Trindade e do Arquipélago Martin Vaz, mas arquivado, em 1965.

Em janeiro de 1958, houve um curioso caso ufológico na Ilha da Trindade. Um disco voador teria sido fotografado fazendo manobras nas imediações da Ilha. O Congresso Nacional solicitou uma investigação pela Marinha, que confirmou o ocorrido, mas o fotógrafo baiano Almiro Baraúna, pioneiro em fotografia submarina, acabou confessando o truque, em 1997.

Em 1995, entrou em operação o Farol da Enseada dos Portugueses, com plano focal de 45 m. Outros dois faróis estão em operação na Ponta da Calheta (foto acima).

Em 1989, foi criada a Reserva Ecológica Municipal das Ilhas Oceânicas da Trindade e Martin Vaz. As cabras foram retiradas até 2004. Em 2011, o Iphan tombou provisoriamente a Ilha da Trindade. Em 25 de agosto de 2016, a Câmara Municipal de Vitória promulgou a Lei № 8.999, definindo a denominação oficial dos logradouros naturais da Ilha da Trindade.

Por Jonildo Bacelar, junho de 2017.

 

Oceano Atlântico

 

Espírito Santo

 

 

Mapa Ilha da Trindade

 

Praia do Andrada na Ilha da Trindade

(Foto Marinha do Brasil)

 

Estação Científica, inaugurada em dezembro de 2011 (foto Marinha do Brasil).

 

A Ilha da Trindade (açenssam) em fragmento do mapa anônimo de Kunstmann III (Pseudo-Pilestrina), cerca de 1506/7. As ilhas a leste são as de Martin Vaz.

 

Tartaruga

 

Kunstmann

 

Praia das Tartarugas e o Pão de Açúcar da Ilha da Trindade

Foto Laboratório de Aves Aquáticas e Tartarugas Marinhas (FURG)

 

As fascinantes formações rochosas da Ilha da Trindade.

 

Ilha

 

Planta antiga

 

Mapa Atlantico Sul

 

Atobás, entre as aves marinhas que se reproduzem na Trindade (foto Laboratório de Aves Aquáticas e Tartarugas Marinhas (FURG)).

 

Tunel

 

Ilhas Oceanicas Brasil

 

Vegetação

 

Pesquisa

 

Martin Vaz

 

Ilha da Trindade

 

Vista parcial do sul da Ilha da Trindade (divulgação).

 

Ilhas Oceano Atlântico

 

Monumento do Andrada erguido em 1910, em granito (foto Galeria da Ilha da Trindade, flickr).

 

Faróis na Ponta da Calheta (foto Marinha do Brasil).

 

Trafalgar

 

Samambaias gigantes na Ilha da Trindade

(Foto Marinha do Brasil)

 

Farois

 

Atobas

 

Trindade

 

200 milhas

 

Sul da Ilha da Trindade, vendo-se o Pão de Açúcar e o Morro do Paredão.

Foto Marinha do Brasil

 

Abrolhos

 

Os navios alemães Cap Trafalgar e Eber na Ilha da Trindade, em 1914, durante a Grande Guerra.

 

 

Atol das Rocas

 

Túnel da Ilha da Trindade (foto Marinha do Brasil).

 

Espirito Santo Turismo

 

Ilha Oceanica

 

Tartaruga marinha na Ilha da Trindade. Pesquisas do Projeto Tamar indicam que a Ilha é o maior sítio reprodutivo brasileiro da tartaruga verde (Chelonia mydas) e área de alimentação da tartaruga de pente (Eretmochelys imbricata).

 

 

 

 

 

A Ponta do Paredão.

 

Monumento Andrada

 

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Morro Vermelho

 

Ilha da Trindade

 

 

 

 

Praia

 

 

 

 

Rochas

 

 

 

Foto: expedição ZY0T - 2003

 

 

 

 

Divulgação